quinta-feira, 15 de agosto de 2013

A Boa Fase Editorial da Poesia Brasileira

Caros leitores do Sacrário das Plangências, quem acompanha de longa data este blog sabe da minha postura cautelosa acerca do gênero poético e de sua recepção e divulgação no Brasil. Em posts mais delicados, como no que eu analisei a lista de leituras para a Fuvest/Unicamp de 2011/2012, percebia que, ao menos no que cinge o Ensino Médio, a poesia tem sido deixada de lado - ou por ser considerada "muito difícil" por acostumados à sintaxe da prosa, ou por um mau ensino do gênero literário - que o demonstra muito mais como uma ciência (cheio de métricas, métodos, formas - que existem, sim -, mas com pouca sensibilidade para contextos históricos, filosóficos e literários, mais condizentes do que exercícios de contagem de decassílabos ou polimétricos...). Mas o que é evidente é que a poesia em terras brasilianas começou, em determinado momento do Século XX, a ficar cercada de um certo "misticismo", tanto das editoras quanto dos leitores, quando se declarou seca a fonte intelectual do gênero, e mais seca ainda a fonte de leitores, fazendo convir, com o passar do tempo, a pergunta: "Quem tem medo de poesia?".

Mas é flagrante que o momento editorial para a poesia, no Brasil, mostra-nos um panorama interessante e em plena transfiguração. Alguns fatos me fazem dizê-lo. Quando soube que Toda Poesia, de Leminski, vendeu, em seis meses, mais de 50 mil exemplares (sendo 20 mil só em um mês e meio), animei-me. Não que Leminski, apesar de sua erudição magnífica, fosse um poeta de complexidade e hermetismo textual como Ernâni Rosas, mas é um poeta, com a justa assinatura do ofício... e, mesmo assim, superou qualquer expectativa de venda para a poesia. É, claro, foi um fenômeno, pois a prosa é que detém essas marcas tão significativas. Mas um fenômeno que nos indica o que está ocorrendo no mercado editorial da poesia.

No último domingo (dia 11/08/2013), na Folha de São Paulo, foi divulgada a notícia de que a Companhia das Letras (a mesma editora que republicou com sucesso o Leminski), republicará a obra de Ana Cristina Cesar, poetisa carioca, falecida em 1983 e que já estava fora de catálogo. Uma editora de tamanho porte republicar obras completas de dois poetas (é bem claro, contemporâneos e de estilos condizentes, por exemplo, ao curto dizer das redes sociais) significa uma clara aposta na poesia. E que se diga, a "Ilustríssima", caderno cultural da Folha, tinha 4 das suas 7 páginas dedicadas ao gênero poético, neste último domingo. É uma exposição deveras interessante. 
Não se pode, no contexto de relançamentos de algumas obras clássicas (independentemente da escola poética), passar desapercebido o relançamento das obras de Cecília Meireles, que até pouco tempo tinha as suas poesias somente encontráveis em Sebos.

Um ponto que é evidente: basta uma passada por livrarias de grande porte para perceber que, na seção "Poesia", a variedade de editoras é enorme. Vai da Multifoco (pela qual publiquei a "Poética das Quimeras") até a emergente Patuá, passando por IbisLibris, Giostri, 7Letras, Escrituras, entre outras (é claro, incluindo-se aí as gigantescas). Nenhum gênero literário cresce e é valorizado sem que tanto as editoras quanto os autores lutem nos literários meios e com os cabíveis esforços para que ele chegue ao público. Toda Poesia, de Leminski, vendeu em tamanha proporção porque a editora (que é uma gigante), é bem claro, distribuiu e divulgou a obra, fazendo com que o público tivesse ampla informação sobre o poeta e, acima de tudo, fácil acesso ao livro. O que percebo é que as obras de poesia, sejam elas de autores iniciantes ou não, estão chegando mais facilmente às estantes das livrarias. Nunca se encontrou tanto poesia quanto agora - consequentemente, nunca se vendeu tanto.

Porém, ainda há paradigmas a serem quebrados. Existem ainda pessoas que bradam o clichê "poesia não vende", ou pior, "no Brasil, quem lerá poesia?". Esse último já era dito - e satirizado - no Século XIX, quando Simbolistas e Filósofos, um dos quais Farias Brito, foram nivelados a outro mundo, não ao Brasil, "pois, em país de carnaval, quem vai ler sobre espiritualidade?"; e, como vimos, apesar do fenômeno Leminski, a poesia vende, sim, apesar da prosa ser ainda o claro foco dos leitores. 
Há também um curioso paradigma a ser rompido: o dos editores. Alguns ainda se sentem inseguros quando o assunto é poesia, mesmo que o gênero já tenha dado sinais de sobrevida e de crescimento no mercado. É evidente que nem todos poetas que mandam originais são realmente bons, mas o que não exclui o fato de que muitos editores ainda vivem em um mercado passado, no qual a poesia era divulgada tão somente nos eventos comandados pela editora ou em um ou outro jornal com interessante aporte (que é até hoje um jeito bom de se divulgar), não tendo uma ferramenta como a internet para auxiliar na divulgação e nas vendas dos livros. Não digo, porém, nas vendas encomendadas por demanda - mas as por E-book. Creio que a editora que tiver tanto o livro físico disponível nas estantes das Livrarias quanto o E-book disponível em seu site sairá na frente no mercado da poesia. E há um motivo para isso: muitas pessoas enxergam ainda um livro de poesia como um livro de "esparsos", não como uma obra com um meio, começo e fim. Cada poema é uma obra independente, mas, se postos em um livro, em ordem determinada pelo autor, há uma lógica e um porquê; mas, mesmo assim, é pelo motivo de um livro de poesia ter essa capacidade excepcional de divisão e singularização de cada poema é que o e-book poderia ser mais utilizado pelas editoras que pretendem publicar o gênero. Utilizá-lo juntamente com a publicação impressa, como eu evidenciei.

Aliás, acerca da internet, é-me claro que o crescimento da poesia está ligado com o crescimento de seu uso. Há muitos bons sites de literatura, e até mesmo uma ferramenta como a Wikipédia auxilia a um leitor interessado, mas com poucas informações sobre um autor ou um estilo, a obter nomes de alguns livros para, enfim, comprá-los em uma livraria. Muitos autores foram redescobertos após o advento da rede digital; muitos, após esse lume, tiveram a sua obra completa disponibilidade - fosse por meio de e-books ou por publicação impressa.

Se, por um lado, não tenho a pretensão de achar que a poesia emplacará dez best-sellers, por outro, suponho melhores ares para o gênero (seja para os poetas futuros ou do passado). O Brasil sempre foi terra de magníficos poetas - muitos dos quais reconhecidos no estrangeiro (apesar, vejam bem, da dificuldade de se traduzir uma poesia em Português) - e não há motivos pelos quais da continuidade desse misticismo de um Brasil anti-poético, sem leitores de poesia - ou fechados na Academia -, mesmo porque os fatos demonstram o contrário. E ei-los que assim continuarão.

Abraços,
Cardoso Tardelli

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